segunda-feira, 31 de agosto de 2009

...

Quero-me mudar.




Preciso de me mudar.




Tenho medo de me mudar.


sábado, 29 de agosto de 2009

Do passado

Hoje foi dia de almoço de família em casa de um tio. Quando lá chegámos, tínhamos a surpresa de duas tias-avós. Eu já não tenho nenhum dos meus avós nesta vida. Mas ainda tenho três tios-avós, um homem e duas mulheres, em cujos traços recordo as feições do meu avô materno. Gosto sempre, por isso, de os rever, quanto mais não seja porque cada vez que acontece sai sempre de lá um abraço sentido e sorrisos de ternura. Hoje não foi diferente.

À mesa do quintalinho de casa do meu tio, rimos e pusemos as conversas em dia. E as minhas tias ficavam com frequência a olhar enternecidas para as mafarriquitas mais pequenas, que por ali andavam a correr e a brincar no meio das plantas, a subir às cadeiras, a esconderem-se debaixo das mesas ou a treparem para o colinho da tia onde às vezes resolviam vir descansar. No meio da brincadeira, de repente percebi que tinha ali quatro gerações da minha família. E que as meninas, embora não tenham conhecido os bisavós (o meu Piu-Piu ainda nasceu uns meses antes da minha avó falecer, mas não se lembra dela, como é óbvio), tinham ali duas tias-bisavós com quem falaram e brincaram.

E eu fiquei ali a olhar para o meu passado e para o meu futuro. Para tanto de nós que passou, para tanto de nós que ainda vai passar. E a desejar sentir mais vezes a sabedoria serena de quem já passou por muitos tempos e sabe muito por dentro de si. A desejar sentir mais vezes aquele reduto de paz de quem transporta a tranquilidade em si. Não sei se um abraço apertado tem o condão de revelar o amor que nos vai na alma. Espero que sim.


quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Carta para a Nikky

Minha querida Nikky,

eu sei que tu tens aí pelo teu estaminé uma pessoa praticamente embatível na sua sabedoria. Mas eu fui avençoada com várias jóias dessas e até lhes pedi ajuda para te escrever. Podia por começar a falar da superidade dos conhecimentos manifestados. De facto, tenho vindo a aprender muitas coisas. Por exemplo, somos um povo que nos adaptamo-nos facilmente. Sobretudo a Espanhã. É que a unica coisa que separa os portugues dos espanhois é o mar que está entre os dois. Ou não sabias tu que, antigamente, portugal situava-se no mediterraneo e no oceano Atlântico? Ou seria no Mediteraneo e no Atelantico? Já não sei bem.

Sei, contudo, que nós, portuguêses, temos um pais onde o desaperecimento de S. Sebastiam deixou muitas marcas. Mas o patriotísmo abunda e nós somos um povo únido e que sabe infrentar todas as situações. Vamos longe, nem que seja num barco à bela. Ou num varco a vela. O importante é levar o Magalhães, que ele resolve tudo, sobretudo os problemas da lingua.

De facto, as novas tecnologias são muito importantes. Repara: surgiu a queda do muro de Berlim e os mass média em 1890. Em simultâneo porque a queda do muro de Berlim foi assistida por muitas pessoas atravéz do meio de comunicação - a televisão. Mas não ficamos por aqui. Sabias que com o surgimento das novas tecnologias passaram a existir várias formas de falar a língua portuguesa? Toda a gente sabe que a lingua actualmente sofreu alterações porque nos nossos
ante passados utilizavam-se certos vocabulários que hoje não fazem sentido
. E que nos precisamos de inovar a língua! Senão ainda apare-se aí um dia alguém a falar de genofobia, misceginação, fluxos emigratórios ou dos velos locais de lazer de Macao e depois nós nem sequer temos vocabulário para preguntar o porque de eles virem visitar este cantinho à beira-mar plantado. De facto, porquê veêm eles para aqui? Vêm á busca de quê?

Mas não te preocupes. Poderam dizer que, dependendo da época ou altura a que se refere, no tempo, existiu uma época onde estávamos todos em maus lençóis, mas sei de fonte segura que agora estamos na rota do sucesso escolar. Derivado aos problemas da escola, que para nós era um deserto o qual não o pizar, o Governo pôs mãos à obra, descobrio a solução e instituio mudanças muito boas. E nos últimos anos criou-se um ambiente proprício para o sucesso, enrequecendo a cultura de todos. Os jovem são uns erois que estudam muitíssimo e os professores não são pressionados a passar quem não sabe nada. Poderia-mos pensar é que isso é um insulto e uma injuntiça de quem concidera que o facilitismo está instalado.

Tendo em conta que estas jóias de que falo têm todas o 12º ano de escolaridade, comesa-se a criar em mim a ideia defenida de que, na realidade, andam por aí uns individos que, atravez de boatos e rumores, andam é atráz de votos, pelo que só sabem caluniar os nossos governantes. Eles, coitadinhos, não governam para as estatísticas nem para as eleições e quando se aperceberam que estas eram importante, no entanto, foi neste caso foi por interesse. Percebeste? Eu também.

Por fim, deixa-me avisar-te: apesar de depois até acabarmos por aceitarmos estas coisas, demora um bocadito a compreender a nova lingua que nos rodeia. É que, com consequência de que ficarmos isolados na nossa sabedoria, às vezes deixamos passar estas oportunidades para evoluir.

Fica bem. Um soriso para ti, irmã de armas.

O Ouriço







Disclaimer: As frases e expressões em itálico são verídicas, mas NÃO são da autoria do Ouriço. Só para que se saiba. ;)

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Recado (XVIII)

Para recordares em dias menos bons. Não te preocupes que passa. O bom que o tempo tem é que a terra transforma tudo e uma semente nunca fica eternamente semente. Mas tens de a regar e tu sabes disso.


Mafalda Veiga - Achados e perdidos

Ao longe vê-se a ponte
O céu que muda
Entre o princípio e o fim
Ao fundo vê-se um monte
De casas velhas
De cor entre ocre e carmim


Eu espero no tempo
Algum sinal teu
Enquanto a saudade aperta
Agarro-me ao mundo
Recolho o que é meu
A ver se a vida se acerta
Naquilo que prometeu

Desenho no horizonte
Uma viagem
Que faço sem me mover
E passo sobre a ponte
Para outra margem
Onde pudesse perder
O peso dos dias
A dor do caminho
Que fica agarrada à pele
Se a vida voasse
Para além do destino
Como a cabeça nos voa
Numa folha de papel

A vida passa sempre
Tão apressada
Que pouco podes conter
Os dias são ausentes
Sabem a nada
Se te esqueceres de viver

Agarra o teu mundo
Acende os lugares
Onde se escondem os teus sentidos
E não tenhas medo
Se às vezes falhares
O que importa é o caminho
Que fica
Entre achados e perdidos


domingo, 23 de agosto de 2009

Mapa



Porque há muitas formas de abandono.



sábado, 22 de agosto de 2009

Dos planos ou Da importância da educação ou De como o melhor do mundo serão sempre (mas mesmo sempre) as crianças

Esta coisa de termos de nos bastar a nós próprios tem muito que se lhe diga. Pondo de lado a questão dos amores e da necessidade de encontrarmos alguém que nos entenda o olhar, as questões práticas do dia-a-dia são, na minha opinião, bem mais fáceis de levar se partilhadas a dois. O mesmo acontece com as questões financeiras.

As situações de abandono e solidão tocam-me muito e, por isso, uma das coisas que mais me preocupa, neste caminho que vou fazendo sozinha, é a necessidade de ter cuidado com os gastos. Num mundo em crise, e apesar de saber que tenho mãos que me ajudem, se precisar, não consigo deixar de me preocupar com o futuro e com a necessidade de zelar para que um dia não passe dificuldades. Independentemente do que vier e porque, se calhar, não vamos ter direito a nenhum tipo de reforma (para lá caminhamos, estou convicta).

Os meus pais tiveram a sorte de terem empregos bons e estáveis. De facto, e apesar de ser profissional liberal, o meu pai não sofreu muito com 'concorrências' (no tempo dele, uma licenciatura era uma gigantesca mais-valia). A minha mãe, por seu lado, cedo ficou colocada de forma definitiva e teve emprego até à aposentação. Isto significa, para muitos casais com a cabeça no sítio, uma vida desafogada e luxos de alguma espécie. Mas a filosofia dos meus pais foi ligeiramente diferente. Ao invés de várias coisas, escolheram vários filhos. O que, em última análise, significa que não há grandes bens físicos ou monetários para herdar. A nossa herança, como diz o meu pai, é o curso que todos tirámos. E, eu acrescentaria, a família que somos.

De facto, vários filhos implica muita despesa, sobretudo a nível escolar, pelo que não sobra muito para outras coisas. Assim sendo, partilhar, fazer passar roupas de um para outro, 'reciclar' livros da escola, etc. sempre fizeram parte do meu quotidiano. Todos aprendemos a usar com parcimónia o dinheiro, todos aprendemos a ajudar. Aliás, a primeira memória de 'planeamento financeiro' que tenho é a de uma reunião familiar (teria eu uns dez anitos?) em que, também numa época de crise, os meus pais se sentaram connosco a explicar que precisavam de levantar as nossas poupanças para conseguirem comprar um apartamento. É óbvio que não necessitavam de nos dizer nada nem de nos 'dar contas', mas nunca mais me esqueci deste episódio. Talvez porque me senti respeitada, naquela altura, independentemente da idade que tinha.

Com coisas como esta, posso dizer que, hoje, todos nós temos a noção dos limites que podemos atingir. Sabemos gerir o nosso dinheiro, não abusamos da sorte. Contudo, estes anos de vida complicada, a esse nível, deixam algumas marcas. A mim, deixaram-me a noção clara de que é imprescindível acautelar o futuro. A ida para Lisboa vai-me proporcionar alguns anos de estabilidade, o que já é muito bom. Poder descansar um pouco a cabeça, a nível de preocupações deste tipo, sabe a oásis. Mas sei bem que não posso baixar a guarda.

Tudo isto para dizer que, apesar dos cuidados, eu acho que agora posso partilhar alguma coisa do que tenho. E por isso dei o pontapé de saída num novo projecto de amor. Daqueles que sempre tive vontade de concretizar e que brevemente, espero, vai tomar uma forma mais concreta. Foi hoje.




PS - Desculpa lá, Apple, mas desta feita eu tinha que te roubar o estilo dos teus fabulosos títulos... :)

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

...

Como é que uma notícia me deixa tão em stress é impressionante... Déjà vu... Conhecem?

















É que nunca, mas nunca mais... É que nem que a vaca tussa...

Da imaginação

Há bocado, ainda em casa dos papás, telefonema da mana. As cachopitas acordaram com o telefone e agora ninguém as deitava. Muito chorosas, porque a mamã não as deixava ver televisão e tinham saudades da tia (vale tudo), acabaram a falar com toda a gente. Todos as informámos de que estávamos deitados, coisa e tal... Quando chegou a vez do meu mano, ele entra na sala a rir-se e a dizer 'Não há dúvida que estas coisas das patranhas se treinam! Estou a tornar-me um tangueiro a sério!'

Pelos vistos, quando atendeu o telefone, ouviu do lado de lá a Farrusca mais nova a queixar-se, muito chorosa (tem cá uma lábia...): 'Ó painho... A mamã num deixa bê tbizão... Eu kia...'
A isto, o meu irmão responde: 'Mas já não são horas! O padrinho já estava a dormir! E até estava a sonhar com castelos e princesas!'
Pergunta pronta do meu Piu-Piu: 'Estavas a salvar alguma?'

Haja histórias de encantar... :)

Dez

Andei a abrir baús e a recordar coisas antigas. Descobri dúvidas que ainda tenho, como esta. Acho que serei sempre assim e assim. Estou-me a transformar nesta mulher. Gostarei sempre disto. Penso coisas como esta ou esta. Irrita-me isto. Já mandei recados como este. E tenho certezas como esta.
Eh eh

...

Vou pôr aqui hoje uma coisa de que falo raras vezes, com raras pessoas (não sei porque é que me dou ainda ao trabalho de dizer isto, se é uma constante em mim. Eh eh). Mas isto é diferente e fiquei a pensar se o deveria fazer. Não é incomum em quem passou por coisas assim, mas depois achei que não haveria razão nenhuma para não contar. E pode até ser que alguém que leia isto pense duas vezes, se algum dia lhe acontecer.

Foi há quase vinte anos (ui... isto soa mesmo mal...). Tinha eu os meus 16 ou 17 e andava numa escola de línguas. Uma noite, já não me lembro porquê, fiquei de repente sem boleia para ir para casa, mesmo no fim das aulas, e a minha mãe teve de me vir buscar. Como a terra onde vivíamos não era propriamente ali ao lado, tive que esperar. A escola fechou, entretanto, e fiquei ali a aguardar. Uns minutos depois, apareceu na rua meia dúzia (uma dezena?) de rapazes aproximadamente da minha idade ou ligeiramente mais velhos. Ao passarem por mim, um, apenas um, aproximou-se, olhou-me de alto a baixo e contornou a coluna onde eu estava encostada. Como que a tirar-me as medidas. Os outros riam-se, entretanto. Mantive-me absolutamente quieta, aparentemente imperturbável e nem olhei para ele. Acabaram por se afastar.
Penso que nunca teria acontecido nada de mais, dado que havia gente a circular ali perto, mas lembro-me de pensar que eu, contra o grupo, nunca teria a mínima hipótese.
Depois, lembro-me de ter andado com uma sensação de estar imunda... Uma sensação absolutamente horrorosa, que não desejo nem ao meu pior inimigo, que me levava apenas a ter vontade de me enfiar na banheira e arrancar (literalmente falando) a pele. Como se ela, de repente, tivesse deixado de me pertencer e fosse apenas esterco colado à carne. Não consigo explicar melhor, sei apenas que é uma coisa horrível de sentir. Durou apenas dois dias, mas lembro-me de pensar que aquilo era provavelmente o sentimento de que as vítimas de violação falavam.

Não tenho, hoje, e que eu saiba, quaisquer problemas relacionados com isto. Mas recordei o episódio no dia em que me deparei com a notícia de que uma rapariga foi obrigada a aguardar 12 horas pelas perícias médicas a que se deve proceder em caso de violação. O hospital justificou-se, dizendo que não as fazia, porque na área de Lisboa elas eram da competência do Instituto de Medicina Legal e não lhes competia fazer um esfregaço nem uma zaragatoa. E este não foi caso único.
Uma coisa tão simples não se faz na capital... Não compreendo nem aceito. Ainda por cima porque há leis que dizem que, em casos de necessidade, os médicos do hospital podem substituir os do IML.
Deve ter sido uma coisa absolutamente pavorosa para aquelas raparigas esperarem 12 horas para tomar banho ou lavar os dentes. E o que se passou é de uma dureza de coração e de uma frieza absolutamente inaceitáveis para mim. Um médico não serve apenas para receitar medicamentos. Um bom profissional zela pela saúde física e psicológica dos pacientes. Mas quer-me parecer que anda aí muita gente para quem as pessoas são um bocado de carne e nada mais.

Eu não desejo mal a ninguém, mas há gente, às vezes, que precisava de passar por elas para ver o que custa...




PS - O meu irmão está a tirar medicina. Nunca ouviu esta história nem conhece este blog. Tenho a impressão que um dia me vou sentar com ele a conversar sobre o assunto. Tão somente para que nunca trate nenhuma paciente assim.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Da cegueira

Magritte - The lovers

A Guizo tem toda a razão no que diz sobre este quadro. É uma explicação possível, pois claro, que a arte é democrática e abrange todos os pontos de vista.

Eu diria que, às vezes, deixamos de ver tudo à volta, dominados pela atracção irresistível de alguém. E o beijo, quando domina tudo, grava-se na carne, independentemente do que sabemos sobre quem está à nossa frente, e é sentido mesmo sem ser sentido, mesmo que o mundo esteja de permeio. Como se diz aqui, 'Ninguém esquece um corpo que teve/nos braços um segundo - um nome sim.'

Este quadro trouxe-me à memória uma canção da Tracy Chapman. A música a traduzir a imagem.



Tracy Chapman - You're the One


quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Da paternidade

Tenho alguns amigos papás. E um deles é especial. Porque cada vez que olho para ele com os filhos, penso que um dia, se Deus me der rebentos, quero um companheiro que tenha parecenças com este pai que posso acompanhar de vez em quando. Tão somente porque quando fala dos filhos, o orgulho ou a preocupação deixam transparecer nos seus olhos o amor que leva dentro. Ele está profundamente presente na vida deles. É atento, preocupado e brinca como eu nunca vi brincar ninguém. E nota-se que não é uma brincadeira de ocasião, porque mal abre os braços tudo é riso e sorriso nos petizes, que reconhecem ali o mimo.

Papá, as crianças só têm um. E hoje já vai havendo por aí muitos homens que assumem de corpo e alma o direito de estar tão cravados na vida dos filhos como as mães. E por isso não têm vergonha nem preguiça em cuidar, às vezes até melhor do que as progenitoras. E não abdicam da partilha da ternura nem da participação na educação, recusando a ideia de que a sua obrigação é apenas monetária. Nem olham como dever o tempo que passam com eles. E só assim se é pai por inteiro, não é?


Mark Knopfler - Cannibals


Found at bee mp3 search engine


Esta é uma das minhas canções favoritas de sempre. E, nem de propósito, encaixa mesmo bem aqui...


Prospecção

Triste, mas bem. À medida que vou observando os meus picos, vou descobrindo feridas escondidas. E sabemos todos que há feridas que só cicatrizam depois de as limparmos. Eu ando aí. A levantar os pensos e a desinfectar. A deixar ao ar para cicatrizarem mais depressa, mesmo que isso signifique levar com a brisa que faz arder.

Nada como um bom confronto connosco próprios para ver o diamante escondido na pedra que dorme na água turva . Não sei o que seria de mim se não andasse a saber de mim...


E pronto...

...já tenho toca em Lisboa.

;)

terça-feira, 18 de agosto de 2009

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Da beleza

O meu mano mais novo não é dado a elogios. Nenhuns, mesmo. Vai daí, quando se lembra de fazer algum, é caso para fazer uma festa.

Hoje estava em casa dos meus pais quando lá cheguei para jantar. No fim do dito, olha para mim e lembra-se de dizer 'Estás com um bronze, tu... E o cabelo fica-te mesmo bem assim... Estás bonita!' Eu ri-me e disse-lhe: 'Eu não estou. Eu sou bonita. Estou é boazona, que é uma coisa diferente!'

O meu mano riu-se, o meu pai começou logo a comentar 'Xiiii... O que vem aí... Se convencimento fosse música...' Mas o facto é que eu senti o que disse. Nunca me achei tão bonita nem tão interessante como agora. Mais completa, mais eu. É o que dá quando as fronteiras de dentro começam a coincidir com as de fora.


James - She's a star


domingo, 16 de agosto de 2009

De volta a casa.

Regressei ontem. Estive algumas horas em sossego completo, a fazer nada a não ser navegar por aqui. Vou recuperando o sabor a estar sozinha no meio das minhas tralhas. Já tinha saudades sem saber que tinha saudades.

Recupero, ao mesmo tempo, memórias destes dias passados. Pouco a pouco, flashes do que foi acontecendo. Conversas, sentires, vistas, brincadeiras. O quente dos braços das minhas meninas, sobretudo. É sempre bom ter alguém por perto a quem podemos pedir um abraço sem mais explicações. Foi assim, estes dias. 'Dá um xi-coração à tia...' E lá vinha ele, apertadinho.

A Farrusca mais nova anda do mais traquinas que se possa imaginar. Dedo em riste a dar-nos prédicas a todos. Quando cheguei de Espanha, por exemplo, foi ver o dedo no ar e ouvi-la a dizer, com ar queixoso: 'Ó kia, demuáste munto...'
De resto, é tudo à maneira dela, mas há sempre forma de lhe dar a volta. Um dia, na praia, pôs-se ao sol sem chapéu, a fingir que não ouvia a minha irmã a chamá-la. Até ao momento em que ela lhe disse: 'Olha que se não pões o chapéu, caem-te os caracóis todos e ficas sem cabelo!' Eh eh. Foi num ápice!

Eu bem que tentei, juro que fiz os possíveis por a catequizar como deve ser. Sempre que se metia comigo na praia, o que acontecia umas milhentas vezes por dia, acabava sentada no meu colo a espernear e só saía se gritasse 'Pôôôôôôôko' (Porto, para o caso de precisarem de tradução). Largava-a de seguida, mas era certo e sabido que, assim que se apanhava a dois passos, gritava 'Póóóóóóóking!' Ou então 'Fenfiiiiiiica!' Aliás, temo bem que tenhamos lampiã na forja... Agora já diz 'Benfica' com todas as letras e, embora tenha o azul como cor favorita, passou a vida à procura de coisas vermelhas só para dizer que eram do Benfas. Pffff...

O meu Piu-Piu passou o tempo todo a asnear. E a andar atrás de mim. Queria histórias atrás de histórias (obrigou-me a descrever os cinco primos do bacalhau Horácio, mas a culpa foi minha. Porque raio não inventei só um???), brincadeiras, mimo.

E pregou-me uma rasteira. Andava no meu pc a brincar quando me chamou porque tinha feito qualquer coisa que não queria. Quando fui ver o que era, reparei que tinha as barras de ferramentas fora do sítio. Andei ali às voltas, mas não dei com a forma de resolver aquilo. Até que me saiu um 'Ó Piu-Piu, gostava de saber que raio fizeste tu, que agora não consigo pôr isto direito...' Vai daí, diz-me ela: 'Queres que te mostre?' E, pimba, não é que mostrou mesmo???? Pegou no rato e pôs as ditas no sítio! Fiquei literalmente de boca aberta. Um pingente de cinco anos que nem ler sabe... E que, nas horas seguintes andou toda vaidosa a declarar que já era 'pofessora'...

Este mesmo pingente lembrou-se de me perguntar, uma noite, já na cama: 'Ó tia, porque é que as meninas têm bibi e os meninos têm pilinha?' Apanhada de surpresa e sem vontade nenhuma de me substituir aos papás, saiu-me um: 'Olha, porque se fôssemos todos iguais isto não era nada divertido, não é?' Depois, no escuro do quarto, escangalhei-me a rir. Lá divertido é, pois com certeza... Pelo menos, deve ser! Eh eh

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

...

O post de ontem trouxe-me uma surpresa e relembrou-me uma realidade que tenho vindo a constatar e que ainda não consegui absorver (eu, quando tenho dúvidas,…).

'Os homens não choram', é frequente ouvir por aí. Não sendo homem, sou o perfeito protótipo da frase, já que raras vezes me viram chorar. Não é, de facto, frequente, porque me faz sentir extraordinariamente frágil e envergonhadíssima por o mostrar. Uma durona, já me disseram. É mais ou menos isso.

Uma das coisas que me faz evitá-lo é a noção que tenho (provavelmente errada, como tenho vindo a perceber) que os homens não gostam de mulheres choronas. Pronto, vá, eu sei bem que há uma grande diferença em estar sempre com a lágrima no olho ou chorar quando nos faz falta exteriorizar a dor. Mas como eu passo facilmente do oito ao oitenta, meto tudo no mesmo saco: uma lagrimita que seja é já um rio. E depois de escrever o último post – e com a vontade gigantesca de o tirar que sempre sinto quando desabafo qualquer coisa mais cá de dentro – fiquei a pensar para mim que os homens (as mulheres reconhecem os sentimentos, acho) que visitam a toca iriam encolher os ombros, assobiar para o ar e pensar 'olha, mais uma lingrinhas desesperada. "Raisparta" as mulheres, todas iguais'.

Pois não foi o que aconteceu. Muito pelo contrário. O que me leva a constatar que é a minha percepção que está errada, embora isso me deixe um bocadinho sem pé, porque fico sem saber qual será, na realidade, aquilo que um homem procura numa mulher, a este nível.

Nunca o 'só sei que nada sei' fez tanto sentido. Cada vez percebo menos de homens…

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

...

Hoje fui andar na praia. Estava a precisar, já há algum tempo, de uns momentos só meus e, por isso, andei, andei, andei, até onde a praia curva. Parei quando as pernas exigiram descanso, numa zona de areal quase livre de gente. Bom, o sossego. Eu, o vento, o mar. O sol a começar a pôr-se. Ali fiquei, a ordenar pensamentos. Ou melhor, a deixar que fluíssem sem regra, sem limites ditados por conversas ou interrupções. Deixei-me apenas levar.

Quando o frio aumentou, levantei-me para regressar. E foi aí, e só aí, que senti uma coisa que há muito tempo não sentia. Antigamente, lembro-me de imaginar a minha cara-metade e de pensar que dormia debaixo do mesmo céu. Estranhamente, o longe e o desconhecido faziam-se perto, devolvendo-me o futuro. E sentia-o perto de mim. Hoje foi só sensação, sem tempo para imaginar. Quando me levantei, pensei apenas que gostaria de o ter ali ao pé de mim, a olhar para aquela calmaria, em silêncio, tranquilo e forte. Por uns escassíssimos segundos, senti-o ali, atrás de mim, a partilhar exactamente o que via. E teria dado tudo por uns braços a envolverem-me…
Escassíssimos segundos, esses. Breve, breve, se esvaíram e deixei-me sentir a dor tranquila de quem sabe o que não tem. Também apenas por uns segundos, porque não me apeteceu sentir aquilo. Recusei a mim mesma a espiral de tristeza. Também não podia, não ali, onde me perguntariam o que se passara. E eu, como sempre, há coisas que guardo só para mim.

Só mais tarde, quando a água do chuveiro (‘Ó tia, poque é qu’o chuveio se chama chuveio?’) se confundiu com a água dos meus olhos, dei vazão ao aperto que sentia dentro. E deixei-me ali ficar, até sentir que a água diminuía a angústia.

Tenho dormido mal, de há dois dias para cá. Tenho a impressão que as minhas férias estão a terminar. Nos próximos dias, vou andar em grande azáfama, a preparar a minha vida. Esta que tenho, sempre indefinida, sempre a prazo, em todas as suas vertentes, pessoal ou profissional. Já me sabia bem ter sossego em algum dos seus campos. Nunca gostei de túneis e tenho a sensação que viajo há demasiado tempo num que não tem nenhuma luz ao fundo.

Sabia-me bem ter uma mão ao lado que me ajudasse a organizar. Precisava agora daquela mão. Precisava que se sentasse ao meu lado a traçar um plano, a ordenar o que a minha cabeça desordenada sabe que tem de fazer, mas não consegue combinar. Ou que apenas olhasse para mim e dissesse ‘Vai tudo correr bem. Porque eu estou aqui. E sempre estarei.’

Antevasin

Adoro ler. Desde pequena que me lembro de andar com livros na mão. Em qualquer lado. Lia às escondidas, à noite, com um foco debaixo dos lençóis. Debaixo da cama, a ouvir a minha mãe a chamar-me tempos infinitos. Lia quando me deitava; acordava e punha-me a ler. Lia tudo o que apanhava, até os policiais escondidos no Antigo Testamento (para meu grande desgosto, só muito mais tarde me apercebi do interesse do Cântico dos Cânticos).

Este afã parou um pouco no meu décimo ano, quando as letras passaram a fazer parte da minha vida de tal forma que descanso era não ler. Passados uns anos retomei, contudo, este amor interrompido. Leio de tudo outra vez. Jornais, romances, biografias, BD e muito mais. Faltam-me uns quantos clássicos e ainda bem: tenho a impressão que algumas obras só devem ser lidas quando os anos já nos vão trazendo algumas lições e o que está escrito assume o seu lugar na sabedoria do nosso coração.

Tenho um livro que vou lendo devagar. A bem dizer, ando a lê-lo há quase um ano. Como é feito de pequenos textos, posso saboreá-lo sem pressas, à medida que me vai apetecendo. Comprei-o por impulso, um dia, e, ao começar a lê-lo, deparei-me com pensamentos imensamente semelhantes aos meus. A autora foi talvez a primeira pessoa que experimentei como parecida comigo. Hoje peguei nele mais uma vez e sorri. O texto 69 (mmm… Este número lembra-me alguma coisa…) espelha-me em várias coisas, fazendo-me confrontar comigo mesma no seguinte:

“A propósito, descobri a minha palavra. Descobri-a na biblioteca, é claro, ou não fosse eu um rato de biblioteca. (…) Estava a ler um texto antigo sobre o ioga quando encontrei a descrição de pessoas desse tempo em demanda espiritual. Nesse parágrafo, aparecia uma palavra em sânscrito: ANTEVASIN. Significa alguém que vive na fronteira. (…) O antevasin era alguém entre dois mundos. Habitava essa fronteira. De onde estava, podia ver ambos os mundos, mas olhava para o desconhecido. (…) Ainda é possível viver naquela linha difusa entre o velho pensamento e o novo entendimento, sempre em estado de aprendizagem. Em sentido figurado, esta é uma fronteira que está sempre a deslocar-se – à medida que avançamos nos nossos estudos e percepções, aquela misteriosa floresta do desconhecido mantém-se sempre alguns passos à nossa frente, para que tenhamos de andar ligeiros para a continuarmos a seguir. Temos de nos manter móveis e flexíveis. Até mesmo escorregadios. (…)
Tinha passado tanto tempo nos últimos anos a perguntar a mim própria qual o meu papel. Esposa? Mãe? Amante? Celibatária? Italiana? Glutona? Viajante? Artista? Iogue? Mas não sou nenhuma dessas coisas, pelo menos não completamente. E também não sou a tia maluca. Sou apenas uma antevasin escorregadia – por entre e no meio de – uma aluna na fronteira em constante mudança junto à floresta maravilhosa e assustadora do que é novo.”

Elizabeth Gilbert – Comer, orar, amar

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Recado (XVII)

"És teimosa e tinhosa!"
Sou, pois. E sarcástica e franca e arrogante e brincalhona e honesta e trocista e directa e muito mais.
E é bom sinal conseguir ser isto tudo. Significa, tão somente, que estou à vontade. Como dizíamos há bocado, os amigos são a família que escolhemos. :)

Clarões

Espanha. Tão longe e tão perto. É, desde há muitos anos, uma casa e continua a ser. Foi muito bom ter ido, por várias razões.

Uma delas, por ter voltado a acontecer o que vai começando a ser habitual, embora eu ainda não me tenha habituado e continue a ser apanhada de surpresa. Primeiro um sentar-se ao lado, uma procura de conversa. Depois, e perante a justificação ‘No he tenido tiempo porque han estado hablando conmigo’, uma resposta: ‘Claro. Tu eres muy simpática e después la gente te busca para hablar…’ Mais à frente, um ‘Te estaba buscando. Vamos al pueblo a beber un café y me acordé de ti.’ Mesmo no fim, um ‘Pienso que todo estamos de acuerdo en que tu conquistaste un rincón en nuestro corazón.’ Fixei estes momentos, mas houve mais. Momentos de conversa puxadas devagarinho. De (re)conhecimento. Que me apanharam de surpresa, por não terem sido únicos. Ouvi ainda outras coisas, vindas de outros lugares, como “a sweet for a sweet person” (ai, P., os gajos de vinte… Eh eh). No fim, e porque eu vou aprendendo a não ser tão atada nestas coisas, saiu-me um ‘Quando fores a Lisboa, diz-me. Vamos tomar um café.’ E de um madrileño andaluz que fala português ouvi um ‘Vou muitas vezes a Portugal. Quando lá for, telefono.’

A probabilidade de isto vir a acontecer é ínfima, como ínfima é a probabilidade de sair daqui alguma coisa. A minha frieza tão própria nestas coisas diz-me que há coisas, como a distância, que pura e simplesmente ditam estes acontecimentos como únicos e irrepetíveis. Não faz mal. Foi bom, tão só, sentir que continuam a acontecer.

À chegada a casa, quase no fim da viagem, e a ouvir uma rádio que nunca ouço, vinha a pensar nisto tudo com o coração quente de sorrisos. A recordar, a medir, como eu gosto de fazer. Num momento de anti-clímax, em que comecei a pensar no que me faz falta, de repente, na rádio, Sérgio Godinho começou a cantar ‘Com um brilhozinho nos olhos…’ E saiu-me uma gargalhada pela coincidência.





A pesar de que no conoces a este blog y probablemente nunca lo vas a conocer, J., yo te agradezco por enseñarme que todavía los hay por ahí. Ha sido importante para mí, ahora que empezaba a pensar que no era posible. Así que, por todo ésto, hoy, pongo aquí esta canción:













PS – Há bocado, ao abrir o mail, levei com mais de vinte pedidos de confirmação de amizade no Facebook. Praticamente todos espanhóis, conhecidos destes dias. Sorri. É bom ver destas coisas.

sábado, 8 de agosto de 2009

Nota solta

¿Sabes que más? Nunca he conocido a nadie tan sonriente como tu… Es increíble, estás siempre sonriendo, tu…

:)

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

España

Amanhã estarei em Espanha. Até dia dez não sei se darei notícias, mas espero que sim. O meu caminho cruzou-se com os nossos vizinhos desde a Universidade. Vivi em Salamanca um ano, um dos que recordo com mais saudade. Pelos amigos, pela experiência, pelo alargar súbito de horizontes. Em Salamanca sinto-me sempre em casa, talvez porque a cidade me recorda a Coimbra onde nasci. Não é para lá que vou, mas não andarei longe.

Espanha cruza-se na minha vida ainda de outra forma. Um dia gostava de fazer a árvore genealógica da minha família e tenho a impressão que, sem surpresa, viria a descobrir uma costela castelhana por entre as minhas. A bem dizer, se o meu apelido fosse o correcto, eu teria o nome de uma cidade espanhola. Mas o meu avô paterno e respectivo irmão gémeo mudaram a ordem do destino: criados desde tenra idade por um padrasto a quem sempre viram como um pai, acabaram por adoptar o nome deste. Resultado: na aldeia do meu pai há duas famílias com o mesmo apelido, mas sem quaisquer laços de consanguinidade, e uma outra que aparentemente nada relaciona connosco, embora sejamos família. A bem dizer, eu gostaria de ter o meu nome espanhol. Porque mais vale um nome que nos lembra os safados dos castelhanos do que um outro que nos transporta para a santidade dos conventos.
É que, como li um dia (onde, senão em Espanha?): ‘Las niñas buenas van al cielo. Las niñas malas van a todos lados.’

Trocos

Não vir aqui é uma coisa estranhíssima. Isto de estar sem Internet já não faz parte dos meus hábitos. Por um lado, não ter o pc sempre ligado é um descanso (necessário). Por outro, contudo, sinto a falta de verbalizar o que anda cá dentro. E de saber daqueles que gosto de acompanhar.

Como a necessidade pode muito, descobri como funciona a net no telemóvel, mas o ecrã demasiado pequeno e a impossibilidade de pôr a render todas as funcionalidades a que estou habituada complicou um bocadito a questão. Não deixei, no entanto, de me sentir como uma criança à frente de uma bancada de doces. Eh eh

Entretanto, e finalmente, descobri um sítio onde vos posso vir ‘cuscar’. E onde posso deixar pensamentos soltos daquilo que têm sido a minha vida. A minha cabeça, estes dias, parece uma carteira cheia de trocos e há moedas grandes e pequenas. Para todas as ocasiões, para todos os bolsos. Tenho a impressão que, se chocalhasse a cabeça, ela tilintaria por todos os lados. Parte desses trocos ficam aqui, partilhados.


1 - Tenho tido pouco tempo para mim, que as pequerruchas não desistem de andar atrás da tia. Uma dum lado, outra de outro, é assim que andamos na rua. Muitas vezes, não há cá pais, tios, avós. Ele é ‘tia’ e acabou-se.
Apesar disso, encontrei, ao longo destes dias, o meu espaço. Para passear, ler, descansar esta cabeça a olhar o mar. Virão mais dias destes e conto passá-los com a mesma rotina. Sabe-me bem este espaço que demorei a conquistar, mas que agora me pertence e de que não quero abdicar mais.

2 – Domingo fui à missa aqui à capelinha da terra. Um calor sufocante é o que nos espera, mas a velha estratégia de ficar à porta resulta sempre. Gosto desta missa, sobretudo pelo padre que a celebra. Desconfio que irei várias vezes ao Sagrado Coração de Jesus só para o ouvir. É um padre muito simples, pouco virado para grandes filosofias, mas, com ele, ninguém sai dali sem um sorriso nos lábios. Desta vez foi gargalhada, mesmo. É bom encontrar quem ache, como eu, que Deus inventou foi o riso e que o choro só nasceu de um momento em que Ele dormitava e se enganou na obra. Mas desta vez não foi isso que me chamou mais a atenção. A determinada altura, entrou na igreja uma senhora já de idade que, ao ver que não tinha lugar, se preparou para ir embora pesarosa, porque não podia ficar de pé. Apontei-lhe o único lugar livre, que ninguém tinha ocupado, e ela sentou-se e ali ficou. Uns minutos depois, outra senhora, ainda mais velha. De bengala. Não havia nenhum lugar vago e ali ficou, de pé. O cabelo grisalho muito bem arranjado e a cor nos lábios não ocultavam a dificuldade em manter uma postura direita. Olhei em redor. Eu, em pé, não podia fazer nada. Mas chocou-me ver algumas pessoas sentadas na primeira fila de bancos aparentando trinta ou quarenta anos que nem um músculo mexeram. Homens e mulheres. Se calhar sou eu que sou retrógrada ao pensar que, mais do que delicadeza, há um valor chamado solidariedade que não pode morrer em cada um de nós. Não sei se essas pessoas a viram ou não no momento. Mas viram-na pelo menos a passar, porque atravessou a igreja mesmo em frente a eles. Para se ir sentar no lugar de que um senhor, tão velho como ela, abdicou.

3 - Ontem à tarde, e depois de carregar no pedal (não se faz, mas às vezes sabe bem) em direcção a casa, fui parada, na estrada que liga Peniche à terreola onde estamos, por um rebanho. Cabras e mais cabras, os chocalhos a marcar o silêncio do campo. Vieram-me à memória lembranças de outros tempos. Em que o avô que já não tenho guiava um carro de bois onde nós nos gostávamos de empoleirar. Um pomar para regar (o que nós adorávamos pegar na enxada e desatar a abrir os regos das árvores), animais para alimentar, fruta para comer acabadinha de apanhar da árvore, acabadinha de trepar, um baloiço só para nós. Bons tempos, esses, em que nada nos atraiçoava a paz.

4 - Mais do que esta tia/madrinha maluca, o meu Piu-Piu tem um padrinho doido, que se lembrou de lhe oferecer uma caixa de areia mágica. Dentro de água molda-se e brilha; assim que a tiramos está absolutamente seca. Um divertimento giríssimo e de tirar a paciência a qualquer tia, a tentar controlar quatro mãos dentro de um recipiente pequeno, e com imensa vontade em ‘ajudar’, para que o chão não fique transformado num rio. Mas cada um tem o que merece. Que poderia eu esperar quando lhes prometo encher de conchas um peixe de plástico e acabo a andar um quilómetro de praia a apanhá-las? Ou quando ao bacalhau Horácio e sua amiga aranha Susana se junta agora uma minhoca de nome Joana? Ou quando acreditam piamente que os meus olhos só abrem, de manhã, se receber uma chuva de beijos nas duas faces (se for só numa, só abre um olho)? Mas eu não me queixo. Não mesmo. ;)

5 - A Faúsca (como ela própria se intitula) tem passado estes dias a dizer ‘Ó tia, estás tão bonita!’ O que eu agradeço, claro. Nem é da roupa, já percebi, porque acontece tanto quando me vê com um vestido de praia, como com os calções mais simples ou acabada de sair do banho, com o cabelo todo molhado. De vez em quando lembra-se de me elogiar. Pode ser de estar a ficar morenaça, mas tenho a impressão que é por causa de outra coisa. Como diria o Sérgio Godinho, deve ser do ‘brilhozinho nos olhos’…

sábado, 1 de agosto de 2009

Contagem decrescente

Quinze dias de férias. Passadas entre Peniche e Espanha. Ora cá, ora lá, que desta vez não me apeteceu passar duas semanas inteiras com a família numa praia cheia de gente, é verdade, mas onde pululam os velhotes e os casais com filhotes. Uma dor forte na anca, que se arrasta há uns dias, leva-me a pensar que não me quero mexer daqui. Mas vou fazê-lo. Sair aqui do ninho e da net, já que virei cá menos vezes. Mas aparecerei, não se livram dos picos assim! ;)

Este ano precisava de espaço para mim, para me sentir comigo mesma. Se pudesse (quem sabe?), pegava numa tenda e ia acampar para as Berlengas. Uns dias sozinha, sem falar com ninguém, sem trabalho atrasado atrás de mim, sem horários, sem conversas. Com tempo para me sentar a olhar o mar e as gaivotas, que bem me entendem no seu voar sem destino. À falta de melhor, creio que vou desaparecer um bocado todos os dias, assim as pequerruchas não andem à bulha pelas minhas mãos.

Talvez nos últimos quinze dias de Agosto consiga fazê-lo. Depende das prospecções em Lisboa, em busca de um poiso pequenino só para mim. Não me apetece procurar uma agulha num palheiro, mas parece-me que não me vou livrar de calcorrear as ruas da capital em busca de casa.

Este mês mal começou e já está cheio. E eu a precisar de esvaziar a cabeça...