Algumas coisas têm-me feito pensar. Nesta Lisboa que é tão igual ao sítio de onde venho ("Consegues viver em Lisboa, M?" - Perguntam-me. "Claro que sim. Sinto-me em casa." - Respondo), há maneiras de ser que me deixam a pensar. Formas de vida diferentes que me fazem repensar e me fazem perceber como sou e como ando. Partilho uma.
Há uns dias, um amigo dizia-me que eu não arriscava nada com ninguém. Perguntou-me quando achava que iria estar 'pronta' para arriscar. E sugeriu, como homem que é, que eu podia pensar em me envolver fisicamente com alguém e deixar correr, 'para ver no que daria'. Sem complicações, sem dramas afectivos. Só instinto a funcionar, à espera que o coração fizesse um click qualquer. Como tanta gente nesta terra parece fazer e, aqui sim, Lisboa é diferente de onde eu venho. Acho eu. Ou então é o meu mundo interior que é diferente.
Percebo-lhe a lógica de homem. Tão típica, eu diria. Mas sinto-me incapaz de me deixar ir numa coisa assim. Primeiro porque eu não consigo dissociar a parte física da parte afectiva. O meu corpo é afecto, dá-se com afecto, sente o afecto. Agradeceria, provavelmente, os mimos de um outro corpo, mas não faço ideia como reagiria depois, à crua luz do dia e da falta de cumplicidade. E não tenho grande vontade de descobrir, porque tenho a impressão de que não iria apreciar a situação.
Não porque não me apeteça. Às vezes só há vontade de sentir umas mãos quaisquer a rodear-nos o corpo e a saciar-nos a fome e a sede e a matar a saudade. Seria capaz, eu sei, até porque é possível usar um qualquer 'botão off' que nos apaga durante algum tempo a razão. Mas provavelmente não aconteceria ao estilo de uma 'one night stand', ou seja, com um desconhecido, porque não sou propriamente dotada de capacidades de me 'acertar' com alguém à primeira. E não me imagino a fazer isto com um qualquer amigo que conhecesse há algum tempo, porque sei que não conseguiria estar com alguém e depois continuar na vida dessa pessoa como se nada tivesse acontecido.
É que não sou capaz de olhar para um homem que comigo partilha a intimidade e ver apenas um corpo... Não dissociando os afectos do prazer físico, acabaria sempre a querer mais, a desejar mais. E, se a relação fosse baseada no prazer físico apenas, não consigo deixar de pensar que acabaria por estar a perder tempo. Se estiver 'ocupada' com um corpo, que uso, embora não o queira para mim, estará livre o meu coração para reparar em quem passa? Fixada em alguém que aprecio, mas com quem não faço quaisquer planos, não ficarei distraída? Não correrei o risco de não reparar em alguém verdadeiramente 'possível', só porque ando entretida com uma coisa sem futuro? Não me sentirei saciada e, por isso, contentada com o pouco, ao invés de procurar o muito?
Entre o tudo e o nada, há o assim-assim. Mas eu não sou mulher de assins-assins. Tendo o nada, quero o tudo. E, por isso, acho que só vale a pena apostar em alguém para quem olhe com a sensação de que talvez possa haver ali um tudo. O que significa que a minha lógica é a de esperar por alguém com quem valha a pena de facto arriscar. Sem certezas, como é óbvio, porque nada é certo ou seguro. Mas entre quem me quer só porque tem vontade de me provar e nada mais e outro que possa olhar para mim e ver mais fundo e mais longe, eu prefiro o segundo...
"Mas, ó M., os homens são suficientemente cabrões para te enganarem. Para te darem esperanças e te deixarem a pensar que querem mais qualquer coisa quando de facto..." É verdade, eu sei. Há por aí muita gente assim, homens e mulheres. Mas os filhos da mãe que já aguentei, se destruíram muita coisa, não conseguiram roubar-me a fé. Há, por isso, um espaço em mim em que guardo a esperança. Porque há homens bons, eu sei. E honestos e verdadeiros. São Homens. Estou rodeada por eles e é por isso que não esqueço que os há. Nada me garante que me calhe um na rifa. Mas vou já tendo armas para me defender de quem não vale a pena. E inteligência para me aperceber de incongruências. E capacidade para desconfiar, no meio da confiança. Nesta confiança de que um dia repararei em alguém que quererá ir mais longe e mais fundo.
Tudo isto é um bocado contra-corrente neste santo mundo em que vivo agora, não é? Talvez por isso, tem-me feito pensar...